12 dezembro 2007

L'erreur qui triomphe



















Passou a luva de camurça pelas bochechas, secou o cachecol, espalhando as bolinhas salgadas pela lã, deixando uma camada fina e brilhante de água. Sacudiu a cabeça num descrer incessante, como se nunca mais fosse acordar. Olhava a luz dos carros passando, lembrando como foi diferente estar com ele em P., onde não havia mais ninguém que um para o outro. Talvez fosse exatamente o fato de estarem em outro país que possibilitou o que ela achava impossível. Idiota, a partida dele provava que nem outra galáxia operaria esse milagre.

Pensou bem na obviedade que era ter um romance em P., ela chegara ao ridículo de pensar que teria com ele o que via no cinema, aqueles roteiros mecânicos e previsíveis com finais adoçados com aspartame, porque sempre deixam um gostinho ruim na boca ao final. Acabou que mesmo com todos os ingredientes de uma história de amor perfeita, tudo se desenrolou como num filme B. E o final foi de filme dos anos 50, aqueles de romance sem final feliz, não como mandava o figurino. Clichê, ela? Imagine, Casablanca não passava agora pela sua cabeça...

Pensando no dia do primeiro encontro, estava tão feliz por encontrá-lo depois de mais de um ano! Era perto dali, numa ruelinha onde havia um bar gay, um albergue e uma loja de bijuterias feitas por um hippie americano. Como ele tinha mudado, morando naquele lugar tão pouco sério, talvez tivesse se libertado. Ela não sabia que chegaria em P. para encontrá-lo tão diferente, esperava que não tivesse transado com outro homem nem nada assim...

N. disse que não só não tinha transado com homem, como não tinha transado com ninguém desde que partira, um ano antes. Devia ser mentira dele pra me comer, pensou bem agora, ele já estava há algumas milhas, com certeza tinha mentido. Que fosse, era uma ilusão boa pensar que ela fora a primeira em tanto tempo. E foi a única por mais um bom tempo... Ele devia estar agora com uma aeromoça no banheirinho da econômica, aquele cheiro desagradável de xixi misturado com perfume barato e sexo. Mania de se torturar assim, não aguentou segurar as próximas lágrimas, que enxugou com força, deixando as bochechas vermelhas.

Precisava colocar a cabeça no lugar e parar de lembrar do começo, tinha que pensar mesmo no fim. Nessa hora veio a lembrança do "te amo" que ele vomitou pra ela numa bebedeira nas escadas da Sacre Coeur, devia fazer um mês. Nunca mais tocaram no assunto, mas ela o guardava. Lembrou-se que foi quando decidiu ficar em P. e jogar tudo pro alto chez elle, remorso não era suficiente pra explicar o que sentia, o desespero de estar ali sozinha. Boba... Nunca poderiam mesmo dar certo, afinal, quem tinha mudado, se mudado e movido céus e terras para eles fora ela! E o que foi que ele fez? Absolutamente nada... E na hora de fazer algo, se jogou no primeiro avião. Tinha mesmo de pensar no que faria agora, sozinha.

Começou a rir baixinho da cena patética de despedida, nunca achou que fosse passar por aquilo, como se em P. o desfecho fosse ser diferente da primeira vez...

Um comentário:

Carol M. disse...

Puxa, gostei demais! Muito bom, talvez porque eu já tenha me sentido assim e o desfecho, de certa forma, também foi o mesmo, acho.
Na verdade, qual mulher já não sentiu tais dores e inquietações ao menos uma vez na vida?

Keep writing que o Quati está lindo.

Beijos, beeeeijos.